sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Inveja .

- Estou? Estou? ESTOU?!

- Matilde?
-Quem fala …?
-É a Alice, será que podemos falar?
-Quem?
- Alice, amiga do Pedro. Conhecemo-nos no aniversário dele.
-Ah claro, que cabeça oca a minha. Diz querida.
-Queria falar contigo sobre o Pedro…


(…)


-Vocês o quê?
-Lamento imenso Matilde! Nem sabes o quanto me arrependo! Nós não o fizemos de propósito, apenas aconteceu. Amamo-nos... Perdoa-nos, por favor, nem me lembrei de ti…
-‘Nem me lembrei de ti’? NÃO TE LEMBRASTE DE MIM? Mas claro! Como é que tu te ias lembrar da namorada do gajo que comeste? Foda-se… Foda-se!
- Por favor, tenta compreender …
-Compreender o quê? A porca que és? Não arranjas gajo para ti e tens de te fazer aos das outras! O Pedro?! Estás com ele, não estás? Ele está ai?
-Não sei do Pedro. Por isso é que te liguei… Ninguém sabe dele desde ontem. Ele foi dar uma volta à praia e não voltou. Pensei que tivesse voltado para Lisboa, sabes, para te contar…
-Ele aqui não esteve.
- Sei que não queres ouvir isto de mim, mas estou preocupada, tenho medo que lhe tenha acontecido alguma coisa.
- Mas achas que me interessam as tuas preocupações, porra? Tenho duas coisas para te dizer. Primeiro: fica com ele à vontade, segundo: diz-me a esse grande filho da mãe que ele foi o meu maior erro e que nunca mais o quero ver à minha frente, ele que se mate! E tu mantém-te bem longe de mim!
- Matilde? Matilde?! Estou?! (desligou)


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-Sim?
-Matilde? Desculpa ligar-te a esta hora, é o Rui, irmão do Pedro.
-Ah, não faz mal. Olá, tudo bem?
-Vou andando. Olha, estou a ligar-te por causa do Pedro.
(minuto de silencio)
- Sim? Diz Rui.
-Bem, nem sei como te dizer isto, mas o Pedro caiu.
-Caiu? Como assim, caiu?
-Caiu da falésia.
-HAN? Ele está bem?
- Está melhor que nós, acho… Caiu ao mar. Encontraram o corpo dele ontem… O velório é amanhã, achei que gostavas de ir.
-Meu Deus. Oh meu Deus … Ele sabe nadar e sabe bem das irregularidades das falésias…
-Se precisares de falar …
(Pi. Pi. Pi)




Caiu? Não. Fizeram-no cair.


Alice enlouqueceu. Não quis que Pedro voltasse para Matilde.
-‘És meu! Já foste dela muito tempo! Agora és meu, eu preciso de ti! Será que não percebes?! Fomos feitos um para o outro!’
-‘Alice, eu não te amo! A noite passada foi um erro. Nunca devia ter acontecido, eu amo a Matilde. Tenho de voltar a Lisboa. Não a vou perder.’
À luz destas palavras, Pedro caiu.


Alice enlouqueceu e errou. ‘Perdoe-me padre, pois pequei. Agi conforme as minhas necessidades e não pensei nas necessidades dos outros… Perdoe-me senhor padre, pois pequei’. O padre contactou as autoridades e Alice morreu no reformatório poucos dias depois, suicídio…
‘Amo-o e tenho de o ver, digam a quem quiser saber que estou onde devia estar. Ao lado dele. Errei ao mandá-lo para longe de mim. Não vou errar outra vez. Vou para ao pé do amor da minha vida. Não me podem prender mais’.
No ombro tinha marcado a inicial do nome dele. P.

Matilde não suportou o sentimento de culpa, achou que ele se tinha privado da vida pelo que ela disse … ‘diz-me a esse grande filho da mãe que ele foi o meu maior erro e que nunca mais o quero ver à minha frente, ele que se mate!’. Ela não suportou o sentimento de culpa e fez-se pelo mesmo caminho.
‘Mãe, Pai: amo-vos do fundo do coração que vocês conceberam com tanto carinho. Ensinaram-me tanto e sem vocês eu não teria coragem de tomar esta decisão. Tirei a vida ao Pedro com míseras palavras, não é justo que fique para contar a história. Mantenham-se fortes e unidos. Os pais do Pedro precisam muito de vocês e eles compreendem-vos melhor que ninguém. Compreendam, ele precisa de companhia e eu preciso de lhe dizer que ele foi o melhor que me aconteceu. Perdoem-me. Não falharam em nada, criaram-me bem. Obrigada por tudo. P.S.: amo-vos.’
Matilde caiu. Não a fizeram cair. Ela caiu. Ela amava-o. Ela caiu.


Três jovens. Pedro-17. Matilde-16. Alice-17.


Tudo por inveja.


(ainda em pequena)
-‘Matilde, que boneca tão bonita… emprestas-me? Quero muito brincar com ela’.
-‘Não a estragues! Amo-a muito.’

As identidades foram ocultadas e substituídas por nomes fictícios por motivos de força maior.

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